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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Pretos Velhos

 


Pretos Velhos

Durante o período da escravidão milhares de crianças, mulheres e homens foram comprados em mercados de escravos africanos e trazidos para o Brasil. Aqui trabalharam duramente construindo a nova nação. Sofreram todo tipo de maus tratos e humilhações quando ensaiavam qualquer forma de revolta contra a condição escrava, ou porque seus donos consideravam natural tratá-los assim. E, apesar de tudo, ainda tiveram forças para reconstruir sua cultura e sua religião na nova terra contra toda a oposição que encontraram. O tempo passou, a escravidão terminou e, pouco a pouco, as religiões de origem africana puderam crescer.

No início do século XX, nasceu a Umbanda e, nela, os espíritos dos antigos escravos começaram a se mostrar em toda a sua realidade de almas bem-aventuradas, espíritos cheios de luz. Temperando sua grande sabedoria com imensa bondade de seu coração os chamados Pretos Velhos e Pretas Velhas se aproximaram de nós, seus fiéis, para, através de seus conselhos, resolver as nossas dúvidas, iluminar os nossos caminhos e curar os nossos males.

Os Pretos Velhos moram no reino de Aruanda, do outro lado do oceano, para onde retornaram em espírito, e toda a sua ancestralidade familiar. Quando escutam os cânticos nos terreiros, vêm de lá visitar seus “netos” que vivem no lado de cá. Estes espíritos de luz (eguns), ao se manifestarem entre nós, nos dão uma grande lição: o valor do indivíduo deve ser apreciado por seus atos, e não por sua aparência. Assim é que esses grandes guias não são reis e nem mestres, mas pais, tios, tias, vovôs e vovós.

Os Pretos Velhos se vestem com simplicidade, usam branco e preto; relembram seus tempos antigos no gosto pelo cachimbo, bom café sem açúcar, o fumo mascado. Um rosário e uma bengala costumam ser seus acessórios preferidos. Como fazem parte das Almas bem aventuradas, sua saudação é: Adorei as Almas!

O dia 13 de maio é consagrado aos Pretos-Velhos, costuma-se fazer festas ou homenagens a eles neste dia ou próximo a ele, data da assinatura da lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil.

A linha dos Pretos Velhos também é chamada Linha das Almas, Iorimá ou linha Africana. Seu chefe supremo é São Cipriano. É constituída de grande grau de desenvolvimento, conhecedores de todos os segredos da magia, e que empregam seu saber na prática da caridade. São conselheiros, protetores e curadores. A linha é dividida em sete Legiões:


  • Legião do povo d'Angola, chefiada por pai José.
  • Legião do povo de Bengala, chefiada por pai Benguela.
  • Legião do povo da Costa, chefiada por Pai Cambinda.
  • Legião do povo do Congo, chefiada por Rei do Congo.
  • Legião do povo de Guiné, chefiada por Zum Guiné.
  • Legião do povo de Luanda, chefiada por pai Francisco.
  • Legião do povo de Moçambique, chefiada por pai Jerônimo.

É muito comum as pessoas adeptas às religiões afro ou simpatizantes à ela procurar pelos Pretos afim de um passe, uma benzedura, curas, pedidos ou até mesmo conselhos destes velhos sábios.

Vovó Catarina

 


Vovó Catarina

Os tambores tocavam o ritmo cadenciado dos Orixás, e nós dançávamos. Dançávamos todos em volta da fogueira improvisada ou à luz de tochas ou velas de cera que fazíamos. A comida era pouca, mas para passar a fome nós dançávamos a dança dos Orixás. E assim, ao som dos tambores de nosso povo, nos divertíamos, para não morrer de tristeza e sofrimento. Eu era chamada de feiticeira. Mas eu não era feiticeira, era curandeira. Entendia de ervas, com as quais fazia remédios para o meu povo, e de parto; eu era a parteira do povo de Angola, que estava errando naquela terra de meu Deus. Até que Sinhazinha me tirou do meu povo. Ela não queria que eu usasse meus conhecimentos para curar os negros, somente os brancos; afinal, negro - dizia ela - tinha que trabalhar e trabalhar até morrer. Depois, era só substituir por outro. Mas Dona Moça não pensava assim. Ela gostava de mim, e eu, dela. Fui jogada num canto, separada dos outros escravos, e todas as noites eu chorava ao saber que meu povo sofria e eu não podia fazer nada para ajudar. De dia eu descascava coco e moía café no pilão. À noite eu cantava sozinha, solitária. E ouvia o cantar triste de meu povo, de longe. Ouvia o lamento dos negros de Angola pedindo a Oxalá a liberdade, que só depois nós entendemos o que era. E os tambores tocavam o seu lamento triste, o seu toque cadenciado, enquanto eu respondia de meu cativeiro com as rezas dos meus Orixás. A liberdade, que era cantada por todos do cativeiro, só mais tarde é que nós a compreendemos. A liberdade era de dentro, e não de fora.
Aqueles eram dias difíceis, e nós aprendemos com os cânticos de Oxóssi e as armas de Ogum o que era se humilhar, sofrer e servir, até que nosso espírito estivesse acostumado tanto ao sofrimento e a servir sem discutir, sem nada obter em troca, que, a um simples sinal de dor ou qualquer necessidade, nós estávamos ali, prontos para servir, preparados para trabalhar. E nosso Pai Oxalá nos ensinou, em meio aos toques dos tambores na senzala ou aos chicotes do capitão, que é mais proveitoso servir e sofrer do que ser servido e provocar a infelicidade dos outros.
Um dia, vítima do desespero de Sinhá, eu fui levada à noite para o tronco, enquanto meus irmãos na senzala cantavam. A cada toque mais forte dos tambores, eu recebia uma chibatada, até que, desfalecendo, fui conduzida nos braços de Oxalá para o reino de Aruanda. Meu corpo, na verdade, estava morto, mas eu estava livre, no meio das estrelas de Aruanda. Em meu espírito não restou nenhum rancor, mas apenas um profundo agradecimento aos meus antigos senhores, por me ensinar, com o suor e o sofrimento, que mais compensa ser bom do que mau; sofrer cumprindo nosso dever do que sorrir na ilusão; trabalhar pelo bem de todos do que servir de tropeço. Eu era agora liberta, e nenhum chicote, nenhuma senzala poderia me prender, porque agora eu poderia ouvir por todo lado o barulho dos tambores de Angola, mas também do Kêtu, de Luanda, de Jêje e de todo lugar. Em meio às estrelas de Aruanda eu rezava. Rezava agradecida ao meu Pai Oxalá.
Fui pra Aruanda, lugar de muita paz! Mas eu retornei. Pedi a meu Pai Oxalá que desse oportunidade pra eu voltar ao Brasil, reencarnar pra poder ajudar a Sinhá, pois ela me ensinou muita coisa com o jeito dela nos tratar. E eu voltei. Agora as coisas pareciam mudadas. Eu não era aquela negra feia e escrava. Era filha de gente grande e bonita, sabia ler e ensinava as crianças dos outros. Um dia bateu na minha porta um homem com uma menina enjeitada da mãe. Era muito esquisita, doente e trazia nela o mal da lepra. Tadinha! Não tinha pra onde ir, e o pai desesperado não sabia o que fazer. Adotei a pobre coitada, fui tratando aos poucos e, quando me casei, levei a menina comigo. Cresceu, deu problema, mas eu a amava muito. Até que um dia ela veio a desencarnar em meus braços, de um jeito que dava dó. Quando eu desencarnei e retornei pra Aruanda, que vocês chamam de plano espiritual, ela veio me receber com os braços abertos e chorando muito, muito mesmo. Perguntei por que chorava, se nós duas agora estávamos livres do sofrimento da carne, então, ela, transformando-se em minha frente, assumiu a feição de Sinhazinha! Ela era a minha Sinhá do tempo do cativeiro. E nós duas nos abraçamos e choramos juntas. Hoje, trabalhamos nas falanges da Umbanda, com a esperança de passar a nossa experiência pra muitos que ainda se encontram perdidos em suas dificuldades.

Passagem extraída do livro "Tambores de Angola

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